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domingo, 17 de janeiro de 2010

DR.BEZERRA DE MENEZES, DR. MARCH DR. ZAMENHOF: MÉDICOS DOS POBRES



Palestra proferida no XVI Encontro Espírita-esperantista do Estado do Rio de Janeiro, Niterói - 06 de dezembro de 2009

Por Affonso Borges Gallego Soares, Diretor do Departamento de Esperanto da FEB - Federação Espírita Brasileira





Dr. Bezerra, do Dr. March, do Dr. Esperanto.

Discorreremos, em paralelo, sobre a vida desses três grandes vultos da vasta Seara do Bem, Seara que, como sabemos, pertence ao Messias de Nazareth.

Precisamos conhecer-lhes os traços nobres de caráter, edificarmo-nos nas suas virtudes e nos testemunhos de suas vidas e de suas obras...

Eles nasceram em meio ao século XIX, em época de floração de novas teses científicas, preparadoras do assombroso desenvolvimento científico, tecnológico do presente; época de floração, ou refloração, de teorias materialistas, com suas conseqüências sociais e políticas; mas também época em que se evidencia a intervenção da Providência — a ação de Deus na História, como se exprimiria Léon Denis — visando a dotar a Humanidade dos preservativos contra a influência desagregadora dessas teorias negativistas.

Quando esses três valorosos Espíritos retornam ao mundo físico, legiões de habitantes do Mundo Invisível invadem organizadamente os cenários terrenos, em prolongado e novo Pentecostes, para que não faltassem à Humanidade as demonstrações palpáveis, concretas, da imortalidade da alma, da sua sobrevivência à morte corpórea, dos destinos construídos na esteira da infinitude dos tempos e dos espaços.

Hydesville, em 1847, assinala o início dessa invasão organizada dos Espíritos, sob as vistas amorosas do Espírito de Verdade. Mas na França, o missionário Rivail-Kardec já aguardava, em nobres serviços, a convocação para contrapor às idéias dissolventes a luz agregadora da Revelação dos Espíritos.

Desceram ao mundo, pois, os nossos homenageados, em época assaz significativa na evolução do mundo e de sua Humanidade.

Adolpho Bezerra de Menezes em 29 de agosto de 1831, em Riacho do Sangue, no Ceará, para desencarnar no Rio de Janeiro, em 11 de abril de 1900.

Guilherme Taylor March em 21 de agosto de 1838, em Teresópolis, desencarnando em Niterói, em 22 de junho de 1922.

Lázaro Luís Zamenhof em 15 de dezembro de 1859, em Bialystok, Polônia, vindo a desencarnar em Varsóvia, em 14 de abril de 1917.

Os anos juvenis já revelam, nos três missionários, sua condição de almas com substancioso progresso intelectual e moral, pois a inclinação que sentiram para a arte de curar, de aliviar sofrimentos físicos, psíquicos e morais denunciava sua sensibilidade diante do sofrimento humano.

Bezerra, March e Zamenhof dedicam-se ao exercício da medicina, e o fazem em plena sintonia com os princípios da Caridade.

Dos três, somente Zamenhof não transitou pelos difíceis e ingratos caminhos da política.

Bezerra foi, por diversas vezes, vereador do município do Rio, e deputado geral também pelo Rio de Janeiro.

O Dr. March elegeu-se como vereador pelo município de Niterói.

Ambos — Bezerra e March — deixaram a vida pública admirados por sua dignidade e honestidade.

O Dr. Zamenhof, por sua condição de judeu, numa Polônia então anexada ao Império Russo, não podia aspirar a qualquer posto de natureza política.

Entretanto, na juventude entregou-se de corpo e alma ao movimento para o estabelecimento e conservação de um estado judeu em que pudessem se abrigar seus irmãos de raça dispersos pelo mundo.

Nesse movimento, havia duas correntes: migrar para os Estados Unidos da América do Norte, adquirindo ali um território, ou migrar para a Palestina e ali restabelecer o antigo território de Israel.

Zamenhof preferia a migração para a América.

Com a inclinação da maioria para o retorno à Palestina, Zamenhof cedeu e aderiu a esta corrente.

Mas seu estreito compromisso com o esperanto o afastou, mais tarde, de movimentos nacionalistas.

Embora se mantivesse sempre fiel às raízes judaicas, Zamenhof não mais se integrou nesse movimento.

Essa posição ele a definiu, de modo inequívoco e indiscutível, quando da fundação de uma Liga Hebraica Esperantista. Em sua alocução, declara:

“Estou profundamente convencido de que todo tipo de nacionalismo representa hoje, para a Humanidade, uma grande infelicidade. O objetivo de todos os homens deveria ser a criação de uma Humanidade que viva em harmonia.

É verdade que o nacionalismo dos oprimidos - como uma autodefesa natural - é muito mais perdoável do que o nacionalismo dos opressores.

Mas, se o nacionalismo dos fortes é vil, o nacionalismo dos fracos é imprudente: ambos geram e sustentam um ao outro, engendrando um círculo vicioso de infelicidades do qual a Humanidade jamais sairá, se não fizermos o sacrifício do amor-próprio grupal e não nos empenharmos por entrar num terreno absolutamente neutro.

Eis o motivo pelo qual não desejo me vincular a um nacionalismo judaico, apesar dos pungentes sofrimentos de minha raça. Desejo apenas trabalhar por uma absoluta justiça entre os homens.

Tenho a profunda convicção de que desse modo proporcionarei à minha pobre raça um benefício muito maior do que servindo a objetivos nacionalistas.

Dissemos que o exercício da medicina, nos três vultos, se caracterizava pela plena sintonia com os princípios da Caridade, manifestada na compaixão pelos sofredores, no absoluto desinteresse material na prestação de seus serviços, com lances que raiavam pelo verdadeiro apostolado.

Creio que nos será útil evocar pelo menos um desses lances na vida de cada um dos missionários aqui em foco.

Era também nesse campo que se manifestava o grande sentimento comum aos três: o amor, o amor ao próximo, amor aos pequeninos, aos deserdados...

Os que conhecem a vida de Bezerra, de March e de Zamenhof certamente leram sobre esses lances, mas nunca é demais — repetimos — recordar o que nos edifica.

Quando da desencarnação do Dr. Bezerra, o jornal “A Gazeta de Notícias” evocou um dos muitos episódios em que o “Médico dos Pobres” viveu a plenitude da abnegação, do devotamento, da caridade.

“Era o Dr. Bezerra presidente de uma companhia, com escritório na Rua Sete de Setembro, quando lhe apareceu um conhecido seu, comunicando-lhe o falecimento de um filhinho e dizendo-lhe, com lágrimas nos olhos, que, achando-se desempregado, não tinha recursos para fazer o enterro.

“O Dr. Bezerra de Menezes chamou-o a um canto e meteu-lhe na algibeira todo o dinheiro que possuía. No momento em que propunha retirar-se para casa (morava ele na Tijuca), reconheceu que, tendo dado tudo, nada lhe restava para a passagem do bonde, e pediu a um amigo 300 réis emprestados!”

Este fato se reproduziu, muitas vezes, com clientes sem recursos que o procuravam.

A vida do Dr. March como médico foi um hino constante à Caridade, pelos sacrifícios que fazia para proporcionar alívio e cura aos seus assistidos.

Mas aqui vamos nos referir a algo que foge à craveira comum, envolvendo um fenômeno espírita raro e o impulso caridoso de um verdadeiro apóstolo da medicina.

O Dr. March já se encontrava preso ao leito de doença, cego pela catarata, e tudo indicava que não mais poderia diminuir o sofrimento do próximo com a sua medicina a serviço da Caridade.

Um dia, um cliente da Caixa recebe um cartão do funcionário Edmundo March, neto do Dr. March.

Pergunta então a Edmundo se ele tinha algum parente falecido, que fora médico e assinava G. March.

Edmundo responde que G. March era pai dele e que ainda vivia, embora já muito doente e preso ao leito.

O cliente lhe diz que não era este, ainda vivo.

Falava de alguém falecido.

E conta a Eduardo que uma filha dele, após distúrbios nervosos, entra em transe e, com voz mudada, lhe diz:

“Quem tem um instrumento como este não deve deixar de aproveitá-lo na prática da caridade; deem-lhe apenas papel e lápis.”

Ele assim fez.

Cessaram os distúrbios nervosos.

Ela passou então a receitar remédios homeopáticos, sendo as receitas assinadas por G. March.

O cliente mostra uma receita a Edmundo e este reconhece a assinatura perfeita do pai, Dr. March, que ainda vivia na carne.

Edmundo, não satisfeito, procura um amigo, pergunta-lhe se aquilo era possível, se o Espírito do pai, ainda vivo no corpo, podia comunicar-se por um médium.

E o amigo, chamado Manuel Lacerda e que trabalhava no Arquivo Nacional, lhe diz:

“Tanto é possível que, no Centro presidido por mim, ele, há mais de dois anos, servindo-se de um médium, vem atendendo a verdadeira multidão de enfermos que o procuram.”

A prisão corporal não conseguiu deter o impulso da caridade no coração do Dr. March.

Zamenhof, apesar de sempre viver com o necessário, chegando mesmo, em certas ocasiões, a experimentar a carência de recursos materiais, nunca fez de sua prática médica um meio de enriquecimento.

Essa prática, em perfeita identidade com a de Bezerra e March, foi sempre inspirada pela compaixão, pela piedade, pelo entranhado amor ao próximo, amor que impregnava todos os movimentos de sua nobre alma.

Muitos episódios evidenciam esse traço de caráter do criador do Esperanto.

Certa vez, atendendo à súplica desesperada de um pai, cuja filha se aproximava de cruel agonia, conseguiu salvá-la após horas seguidas de incansável intervenção.

Vendo, porém a miséria reinante naquele lar, Zamenhof não somente dispensou o pai de qualquer pagamento, como também deixou seus poucos recursos para a compra de medicamentos.

De outra feita, compondo com outros colegas uma junta para socorro a uma anciã, recusou-se, terminantemente, ao contrário dos outros médicos, a receber quaisquer honorários, simplesmente porque não foi possível evitar o desenlace da ciente.

Falemos também sobre as relações de Bezerra de Menezes e Guilherme March com o esperanto, que o gênio de Zamenhof lançara em 26 de julho de 1887.

Há depoimentos consistentes a respeito da adesão do Dr. March à Língua Internacional neutra, que ele usava inclusive para corresponder-se com colegas do mundo inteiro a respeito das práticas homeopáticas.

Consta, então, segundo a excelente obra biográfica de Alexandre Rocha — “Dr. March em dois planos” — um trecho atribuído ao Dr. Ramon Benito Alonso, quando discursava sobre o Dr. March no dia 30 de agosto de 1922, na sede da antiga F.E.E.R.J. - Federação Espírita do Estado do Rio de Janeiro.

“Possuidor de notável erudição, o Dr. March falava as línguas dos homens: o grego, o latim, o francês, o inglês, o alemão... E, aos 70 anos, quando a maioria dos homens já se considera de posse do máximo conhecimento que a vida lhe poderia fornecer, negando-se à busca de novos conhecimentos, ele se dedicou ao aprendizado do esperanto, deixando-se contaminar pelo ideal de fraternidade do missionário polonês Lázaro Luís Zamenhof, e passando, com isso, a também falar a língua que a misericórdia divina enviou ao nosso planeta para trazer a paz entre os povos. Falava, pois, o Dr. March também o esperanto, a língua dos anjos.”

Não conhecemos registro a respeito das relações do Dr. Bezerra, encarnado, com o esperanto.

É provável que tenha ouvido falar dele, pois era também um pensador, interessado na cultura em geral, nas idéias progressistas em circulação.



Mas convém não perdermos de vista que as primeiras repercussões do esperanto no Brasil — repercussões de maior alcance — só se deram a partir de 1898, quando Medeiros e Albuquerque empreendeu uma inteligente propaganda do idioma em 15 de abril de 1898 nas páginas da “Revista Brasileira”, dirigida por José Veríssimo, sob a forma de brilhante artigo intitulado “Uma língua internacional — Esperanto”.

Já três dias antes, no número de 12 de abril de 1898, o jornal “O Paíz” — em que também colaborava o Dr. Bezerra — publicava um belo texto de Arthur de Azevedo sobre a língua.

Então, o Dr. Bezerra certamente informou-se sobre o esperanto e, sem dúvida alguma, o apoiava no pensamento e no coração, mas não teve tempo para se manifestar de forma mais explicita, porque adoeceria gravemente no final de 1899, para desencarnar em 11 de abril de 1900.

Como Espírito, Bezerra, principalmente através de D. Yvonne A. Pereira, deixou precioso incentivo a que os espíritas estudem e pratiquem o idioma neutro e seus ideais.

No emocionante enredo da obra A Tragédia de Santa Maria, ditada a D. Yvonne, Bezerra de Menezes envolve o início de um belo romance de amor, com raízes em passado reencarnatório, numa aproximação das almas enamoradas através de correspondência em Esperanto. Aproveita então o venerando Guia espiritual para incentivar-nos aos estudos da genial criação de Zamenhof com exortações que vale a pena aqui recordar:

“O Esperanto está a serviço da Fraternidade como a Beneficência está a serviço do Amor... e introduzir a mocidade no seu estudo racional é adverti-la a se preparar para um futuro radioso, que tenderá a enlaçar a Humanidade num mesmo elo de vibrações afetivas...”

“Os adeptos da Doutrina Espírita cedo compreendem o valioso concurso do idioma Esperanto ao ideal de unificação humana que esposam...”

“O espírita, quiçá melhor ainda que qualquer outro idealista encontra no Esperanto afinidade e ensejos para o desdobramento dos dilatados sonhos de solidariedade humana que lhe transbordam do seio...”

Zamenhof é o próprio criador do Esperanto.

Mas não se limitou, nas expansões do seu idealismo, todo tecido nas aspirações à concórdia, à fraternidade, à solidariedade, à tolerância, a apenas criar um idioma universal que possibilitasse a união das criaturas sobre um fundamento lingüístico neutro.

Zamenhof também concebeu um código superior de convivência fraterna entre grupos separados pelas barreiras da nacionalidade, da língua, da religião, da raça.

Bem vivido, esse código, que é um puro reflexo do Evangelho de Jesus, possibilitará a aproximação dos homens por sobre todas as diferenças que os têm separado no mundo.

Zamenhof sabia, sentia, por experiência própria, que uma das grandes barreiras que se levantam entre os homens tem sido, paradoxalmente, a religião em suas diversas formas.

Concebe então o chamado Homaranismo, um conjunto de regras para a convivência pacífica, fraternal, das culturas, dos grupos religiosos, das raças.

Quando se reunissem pessoas de diferentes cultos, nacionalidades, raças, elas renunciariam às particularidades próprias dessas diferenças e se relacionariam de acordo com as regras do Homaranismo.

Teriam como princípios comuns apenas Deus, os que nEle cressem, sem que se impusessem, uns aos outros, a maneira pela qual concebem a Divindade, e a regra - “agir com os outros da mesma forma como queremos que os outros ajam conosco”.

O mesmo princípio de respeito prevaleceria para os que nenhuma religião professassem e não cressem em Deus.

Finalmente, um paralelo a respeito das idéias religiosas dos três vultos.

Desnecessário dizer da confissão espírita do Dr. Bezerra e do Dr. March.

Como espíritas, viveram as grandes divisas “Trabalho, Solidariedade, Tolerância” e “Fora da Caridade não há salvação”. Jamais perderam de vista o caráter cristão da Doutrina dos Espíritos, não obstante haverem sido homens de ciência, de cultura.

Cultivaram o dever de fraternidade para com os profitentes de outras religiões, posicionando-se firmemente contra o sectarismo religioso.

E na defesa dos princípios espíritas não se afastaram jamais do Evangelho de Jesus, agindo com prudência, equilíbrio, mansidão e amor fraternal, fiéis à mensagem pacificadora do Cristo de Deus.

Quanto a Zamenhof, sabemos que se declarava um hebreu livre-pensador.

Sempre se manteve fiel às tradições judaicas, herdadas dos pais, solidário com os sofrimentos que as discriminações seculares impunham aos seus irmãos de raça.

Entretanto, também sempre pairou por sobre quaisquer princípios que fomentassem divisões, separações, discriminações de qualquer espécie.

Seu Homaranismo atesta essas virtudes não apenas apregoadas, mas principalmente vividas.

Ficou conhecido, na vida pública e na vida privada, pela prática de virtudes como o perdão, o espírito de pacificação, a sincera humildade, a modéstia, a simplicidade, a tolerância, a benevolência, a indulgência.

É interessante observar que os três, quando ainda na juventude, experimentaram o jugo do ceticismo, da descrença, que, entretanto, logo sacudiram, afirmando sua fé nos destinos espirituais do homem e vivendo de acordo com essa fé.

Zamenhof teria tido contacto com as revelações e as práticas espíritas?

Não o sabemos.

Entretanto, existem algumas declarações, escritas por ele de próprio punho, que talvez possam fazer-nos supor alguma influência dessa ordem de idéias na alma sensível do gênio de Bialystok.

Eis trechos significativos de um texto encontrado em alguns de seus manuscritos:

“Enquanto no mundo científico vou perder toda a estima, no mundo dos crentes não vou encontrar nenhuma simpatia para compensar; possivelmente só ataques, pois meu credo é completamente diferente do deles... Seria mais prudente que eu silenciasse; mas não posso”

“Eu percebia que possivelmente a morte não era o desaparecimento...; que existem certas leis na Natureza...; que algo me conserva para um alto objetivo...”

Concluímos, enumerando virtudes e traços de caráter comuns aos três vultos que hoje foram objeto de nossa reverente homenagem:

Fé em Deus, como a Inteligência Suprema diretora do Universo

Fé no futuro – Caridade - Espírito de tolerância - Solidariedade

Beneficência - Humildade sincera – Piedade - Benevolência

Afabilidade – Solicitude - Espírito humanitário - Indulgência

Espírito de perdão



1 comentários:

maria da conceição disse...

Ismael

que comparações maravilhosas.
parabéns por sua sagacidade !


Maria da Conceição Stern